Com este livro começa a segunda divisão do Antigo Testamento. Segundo o arranjo do cânone judaico, Josué é o primeiro livro da divisão chamada de Os Profetas, e faz parte de sua primeira subdivisão, designada "Os Profetas Anteriores" para distinguí-los dos livros proféticos que são encontrados posteriormente no Antigo Testamento, sob os nomes de homens profetas. Tomam o nome de profetas pelo fato de narrar a história contida neles da perspectiva profética: fazer avaliações, diante de Deus, dos personagens e eventos registrados; narrar somente eventos e pessoas chaves; e focalizar sempre a atuação de Deus dentro da história. Os autores não teriam de ter ocupado o ofício de profeta mas de ter tido o dom profético. Um levita ou um sacerdote, por exemplo, podia ocupar seu ofício não profético mas também ter o dom de profecia(II Cr 20.14). Samuel era juiz, mas ocupava o ofício adicional de profeta e oficiava cerimônias sacrificiais, uma função sacerdotal. A classificação, então, focaliza o dom profético do autor e a maneira de abordar o assunto.
Segundo o cânone cristão, com base na Septuaginta, Josué é o primeiro dos doze livros históricos. Esta maneira de classificar os livros parece olhar-lhes sob o prisma do tipo literário observado neles, o de narrativa histórica. Alguns estudiosos modernos preferem juntar Josué com o Pentateuco e assim falar do Hexateuco. Ainda outros desses dizem que os livros de Deuteronômio, Josué, Juízes, Samuel e Reis formam uma unidade que designam como "A Obra Histórica Deuteronomista". Por isto, os livros de Gênesis, Êxodo, Levítico e Números devem ser também considerados como uma unidade, designada de "Tetrateuco". Embora haja algum valor em estudar tais teorias, parece-nos melhor manter a unidade do Pentateuco, agrupando Josué com os livros que o seguem.
2. O Seu Nome
O livro é universalmente designado pelo nome do seu herói maior, que domina o cenário do começo ao fim do conteúdo. O nome no original significa "Salvação de Iavé" ou "Iavé é Salvador". Eqüivale ao nome "Jesus", proveniente do grego(através do latim) que dependia do aramaico, que por sua vez dependia do hebraico. Tanto na Bíblia Hebraica como na Septuaginta o nome do livro é o mesmo, Josué.
3. A Sua Autoria
A - O autor de Josué é desconhecido. O texto em 24.26 diz, "Josué escreveu estas palavras no livro da lei de Deus", o que na superfície poderia ser tomado como indicação do autor do livro todo. Torna-se claro, contudo, que a referência aponta para a aliança registrada em 24.2-25. Como é claro no caso do Pentateuco é também evidente que alguém registrava os acontecimentos principais da história de Israel enquanto aconteciam.
B - Tradicionalmente Josué tem sido tomado como o autor. As evidências dentro do próprio texto apontam para uma testemunha ocular de certa parte dos eventos registrados no livro:
1. O uso da primeira pessoa no texto hebraico em 5.1: "... até que passássemos..." e 5.6: "... prometera a seus pais nos daria...", embora no primeiro caso alguns manuscritos leiam "passassem".
2. O pronome "vosso" em 15.4 sugere escrito autobiográfico, pois o autor se apresenta como encarregado se dirigindo aos homens de Judá na segunda pessoa do plural.
3. Referências à "grande Sidom" em 11.8 e 19.28 e aos fenícios pela designação "os sidônios" em 13.4-6 sugerem uma data anterior ao século XII a.C. quando Tiro tomou o lugar de Sidom como a cidade principal dos fenícios. Josué teria liderado na conquista em torno de 1280 ou 1240 a.C., um século antes da ascendência de Tiro.
4. O fato de os Filisteus não serem mencionados no livro como uma grande ameaça aos hebreus indica uma data anterior a 1200 a.C., quando deu a chegada maciça ao litoral ocidental de Canaã dos filisteus. Segundo 11.21 são os anaquins, não os filisteus, que habitavam as cidades que posteriormente forma tomadas pelos filisteus. Os filisteus, indicados no livro de Juízes entre os maiores inimigos de Israel depois de Josué também não constam da lista dos principais habitantes da terra em 12.8, o qual reflete os tempos da conquista.
C - Existem, por outro lado, referências textuais que sugerem uma data posterior ao período de Josué.
1. O relato da sua morte em 24.29,30.
2. Eventos que aconteceram posteriormente à morte de Josué, como a conquista de Hebrom por Calebe: Josué ordenou que o lugar fosse dado a Calebe, segundo 15.13,14, mas segundo Juízes 1.10 e 20 a tribo de Judá conquistou Hebrom dos cananeus e assim a família de Calebe tomou posse do lugar, no período após Josué. Parece que a linguagem de Josué 15.13,14 reflita um autor que olha para trás para registrar quando foi cumprida a ordem de Josué. A migração da tribo de Dã para Lesem bem ao norte de Canaã é mencionada em 19.47, mas o acontecimento deu-se no período de juízes e é registrado em Juízes 17 e 18.
3. A expressão "até os dias de hoje" usada repetidamente no livro claramente indica um autor de uma época bem diferente do período do homem Josué. A frase é encontrada em 4.9; 6.25; 7.26; 8.28; 9.27; 10.27; 13.13; 14.14; 15.63 e 16.10.
4. A menção em 10.13 da antiga fonte, "O Livro dos Justos"(ou literalmente "de Jassar"), parece apontar para trás da perspectiva de um autor, ou editor, que teria vivido bem depois de Josué. O Livro dos Justos existia no período do Rei Davi(II Samuel 1.18), e parece uma composição feita pela ordem do rei quando Israel tornou-se um povo com governo central. Se fosse assim, teria sido citado pelo autor de Josué como indicação de fonte autorizada à qual o autor apelou. Se o Livro dos Justos não estivesse escrito no período de Davi, ainda estava em desenvolvimento, capaz de sofrer um acréscimo na época do rei.
5. Uma fonte usada pelo autor final do livro de Josué é mencionada em 24.26. É o relato da renovação da aliança com a terceira geração após a saída do Egito, relato escrito por Josué mesmo e citado em 24.2-25.
D - As evidências internas do texto inspirado apontam para a seguinte conclusão. Teria havido um autor das fontes básicas do livro, autor(ou autores) que era testemunha ocular dos eventos que descreveu. Este autor poderia ter sido o próprio Josué ou um sacerdote ou outro designado por Josué. O impulso atrás do esforço deveria ser atribuído à liderança de Josué, embora remonte ao exemplo e à ordem de Moisés. Também teria havido um outro autor, ou editor, de uma época posterior a Josué, no período do reino de Davi ou depois, que teria completado e atualizado o livro, levando-o à sua forma atual.
4. O Seu Tema
Não pode restar dúvida de que o tema do livro é "A conquista e a Divisão da Terra Prometida". Ver 1.2; 12.7,24; e 13.7 como versículos chaves neste sentido. As ênfases no texto do livro que são percebidas por uma leitura do livro todo também levam à esta conclusão.
5. A Sua Natureza
Uma vez levando em conta o destaque que a aliança tem no pentateuco, e sabendo a respeito dos itens envolvidos numa cerimônia de instituição e renovação, torna-se evidente que o livro de Josué consta de um livro de renovação da aliança. Êxodo registra a instituição da aliança com a primeira geração saída do Egito (cap.19-24). Deuteronômio registra a reiteração dos eventos e termos das aliança registrada em Êxodo, mas dentro de um contexto de levar ao registro da renovação daquela aliança com a segunda geração de Israel. Josué, por sua vez, registra os eventos que levaram à renovação da antiga aliança com a terceira geração(24).
6. O Seu Esboço
A - A preparação para invadir a terra ao ocidente do Jordão(1-2).
B - A travessia miraculosa do Jordão(3-4).
C - A conquista da terra em três campanhas(5-12).
1. Canaã central(5.1-8.35).
2. Canaã ao sul(9.1-10.43).
3. Canaã ao norte(11.1-23).
D - Um sumário da conquista(12).
II - A Divisão da Terra Prometida entre as Tribos de Israel(13-22).
III - A Renovação da Aliança Mosaica com a Terceira Geração em Siquém(23-24)